quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Entrevista com o presidente do sindicato nacional dos AFRFB

Receita Federal: veja entrevista com presidente do Sindifisco

Projeto de vida para muitas pessoas, o ingresso no cargo de auditor-fiscal da Receita Federal exige muita dedicação aos estudos e perseverança. E segundo afirmou, em entrevista à FOLHA DIRIGIDA, o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco Nacional), Pedro Delarue, aqueles que alcançam o objetivo são premiados com uma carreira gratificante, sobretudo do ponto de vista das oportunidades de trabalho. "A carreira é altamente compensadora nesse sentido. Não tem um ramo apenas para se trabalhar. Têm várias áreas onde a pessoa pode desempenhar a sua melhor aptidão", disse.

Delarue falou também sobre questões importantes para a categoria, como a implementação da Lei Orgânica do Fisco (LOF) e a expectativa da retomada dos concursos periódicos da Receita Federal. "Acho que os concursos deveriam ser anuais, ou pelo menos a cada dois anos, para, no mínimo, suprir a falta daqueles que estão se aposentando", avaliou o sindicalista, afirmando que há necessidade de mais auditores em diversas areas

FOLHA DIRIGIDA - Qual a importância do trabalho realizado pelos auditores-fiscais da Receita Federal?
- O auditor-fiscal interpreta a legislação tributária, participa da formulação da política tributária, fiscaliza o correto cumprimento das obrigações tributárias pelos contribuintes, eventualmente dirimindo dúvidas do contribuinte quanto à interpretação da legislação, e também fiscalizando e aplicando as devidas sansões caso ele não tenha cumprido com suas obrigações. Na área aduaneira, o auditor realiza o controle do fluxo de mercadorias nas fronteiras, portos e aeroportos.

FOLHA DIRIGIDA - E qual o peso desse trabalho no desenvolvimento do país?
- É fundamental. Para se ter uma idéia, a Constituição prevê a administração tributária como essencial ao funcionamento do Estado. Fazendo uma comparação, o Ministério Público e o Judiciário são essenciais ao funcionamento da Justiça. E a Justiça é só um dos braços do Estado. A fiscalização tributária é considerada pela própria Constituição essencial ao funcionamento de todo o Estado, não apenas da Justiça. Então, sem a fiscalização, o país não trabalha, não funciona, não sobrevive.

FOLHA DIRIGIDA - O senhor acredita que os auditores são valorizados de acordo com esse papel importante que eles possuem?
- Ainda não chegamos no grau de valorização que pretendemos. Mas é preciso reconhecer que no passado recente nós tivemos uma boa valorização. Mas ainda não chegamos lá.

FOLHA DIRIGIDA - Em geral, a preparação para ingressar no cargo de auditor-fiscal precisa ser muito rigorosa. É uma caminhada árdua. A carreira possibilita um retorno de tudo o que é investido?
- A pessoa para ser um auditor-fiscal tem que ter conhecimento sobre vários ramos. Não é só Direito, só Contabilidade, só Economia. Tem que se aprofundar em vários ramos do conhecimento humano. Tanto é que ela é aberta a todos os profissionais que tenham o nível superior. Então, é uma carreira que é compensadora também sob esse aspecto. Eu, por exemplo, sou engenheiro. A carreira é altamente compensadora nesse sentido. Não tem um ramo apenas para se trabalhar. Tem a fiscalização, que exige mais Contabilidade; a tributação, que exige mais conhecimento de Direito; a aduana, que exige mais uma formação de poder de polícia. Tem a repressão, por exemplo, que é o combate ao contrabando e ao descaminho, e até mesmo ao tráfico. Têm várias áreas onde a pessoa pode desempenhar a sua melhor aptidão.

FOLHA DIRIGIDA - E como é a distribuição dos auditores por essas áreas? É de acordo com a formação ou quando eles ingressam fazem uma escolha e é feita uma preparação?
- Normalmente, o que acontece hoje na Receita é que as pessoas que ingressam vão para os lugares mais distantes, mas inóspitos, e onde falta mais gente, que são as fronteiras. E depois de alguns anos, quando uma outra turma chega, essas pessoas vão para os centros maiores. E aí sim, conforme a disponibilidade que houver na delegacia para onde a pessoa vai, ela vai poder escolher a área para a qual tem maior aptidão.

FOLHA DIRIGIDA - É possível definir um perfil que a pessoa deve ter para ser um auditor-fiscal da Receita?
- A pessoa tem que saber que serviço público é uma entrega. Ela vai exercer uma opção de ser um servidor público e não de se servir do público. Ao final, ela vai ter uma aposentadoria garantida e uma série de benefícios, que vão fazer com que ele tenha uma vida tranqüila. Mas ninguém entre no serviço público achando que vai ficar milionário.

FOLHA DIRIGIDA - E existe realmente um glamour, um deslumbramento com relação ao cargo de auditor-fiscal, por ser uma das carreiras mais bem pagas do Executivo federal. Mas é, então, uma carreira, sobretudo, de muito trabalho?
- Muito trabalho, muita entrega. E também de riscos, tanto do ponto de vista físico, porque lidamos muitas vezes com a bandidagem, quanto do ponto de vista funcional, porque podemos tomar decisões em determinados momentos da nossa carreira que envolvem milhões, até bilhões de reais. Então, esse é o glamour, o poder de decisão que se tem para ir, por exemplo, em uma grande empresa e sair de lá com um crédito tributário, que a empresa estaria tentando sonegar, que pode chegar a bilhões de reais. É gratificante o tipo de trabalho que nós fazemos.

FOLHA DIRIGIDA - Mas tem alguma característica fundamental que a pessoa tem que ter? Ou qualquer pessoa pode se adequar e se tornar um auditor-fiscal da Receita?
- Qualquer pessoa que entenda que o serviço público é praticamente um sacerdócio e tenha força de vontade, tendo o nível superior, pode ser auditor-fiscal.

FOLHA DIRIGIDA - E quanto à preparação? O senhor já passou por isso. Que sugestões o senhor dá para quem sonha ser um auditor-fiscal da Receita?
- Quando eu comecei a me preparar para o concurso de auditor-fiscal, a minha vida parou. Eu estudava até 16 horas por dia. Isso durante três meses. A quantidade de conhecimento exigido para uma prova de auditor-fiscal é muito grande, são muitas matérias. A pessoa tem realmente que se dedicar muito para conseguir passar. Até porque a concorrência é enorme e altamente qualificada. No meu caso, por exemplo, foram 16 horas de estudo diariamente, inclusive aos sábados, domingos e feriados. Na verdade, foram dois meses sem essa pressão toda, e os últimos três meses nesse nível. Foram cinco meses de preparação exclusiva.

FOLHA DIRIGIDA - Uma preparação até breve, então? Há muitos casos em que o período de estudos se estendeu por muito mais tempo. Por anos, às vezes.
- É uma outra opção. A pessoa pode se preparar durante anos sem esse aprofundamento todo. Mas eu aconselho que nos últimos meses, de qualquer forma, se faça uma imersão.


FOLHA DIRIGIDA - E há a expectativa de retomada dos concursos para a Receita Federal. O senhor aconselha que as pessoas interessadas já comecem a estudar e que façam esse aprofundamento após a publicação do edital?
- Muitas vezes se começa a estudar sem a perspectiva de ter o concurso logo a frente. E eu acho que é importante, porque a pessoa, inclusive, vai treinando para o de auditor-fiscal em outros concursos, com menor grau de dificuldade. Até porque é importante se acostumar com a prova. Fazer outras provas para entender a lógica da prova de múltipla escolha.

FOLHA DIRIGIDA - No caso dessas pessoas que estão se preparando há muito tempo, o que elas podem fazer para não se desmotivarem?
- Acho que principalmente a pessoa tem que ter a certeza de que persistindo ela vai conseguir. É comum que a pessoa passe no segundo ou terceiro concurso que presta. Por isso, inclusive, eu aconselho a fazer outros concursos para elevar a autoestima, saber que está bem preparado e que pode passar para um cargo difícil como o de auditor-fiscal.

FOLHA DIRIGIDA - Falando um pouco sobre temas importantes para a categoria, está sendo discutida a Lei Orgânica do Fisco (LOF). O que é e que benefícios a LOF vai trazer a partir da sua implementação?
- A Lei Orgânica do Fisco tem que ser entendida como um benefício não para o auditor-fiscal e não apenas para a Receita Federal. É um benefício para toda a sociedade. Uma das principais novidades da Lei Orgânica é que ela traz algumas prerrogativas importantes para o desempenho do cargo. Em um cargo tão importante quanto o de auditor-fiscal é necessário ter determinadas garantias, de que não haverá pressões de ordem política ou de alguns setores poderosos economicamente para que se haja de uma forma ou de outra. O auditor tem que agir de acordo com as suas convicções pessoais. E isso não admite, em benefício da sociedade, nenhuma espécie de pressão externa. Então, a Lei Orgânica traz determinadas garantias e prerrogativas tanto para a Receita Federal quanto para o auditor-fiscal, de que ele vai estar imune a essas pressões políticas e do poder econômico.

FOLHA DIRIGIDA - De que forma ela traz essas garantias?
- Por exemplo, ela textualmente diz que o auditor-fiscal tem liberdade de convicção. Ou seja, uma vez que ele se convence de determinada coisa, ele vai até o fim com aquilo. E é claro, o contribuinte vai ter oportunidade de, lá na frente, contestar isso, seja na própria administração, através das delegacias de julgamento, seja no Judiciário. O auditor-fiscal, na sua convicção, só está preso à lei e àquelas normas que são de caráter vinculante na administração. Então, ninguém pode interferir, intervir no trabalho do auditor-fiscal. Por outro lado, e aí é o contrapeso, na questão da Corregedoria, por exemplo, há sanções disciplinares para a prevenção do enriquecimento ilícito, da corrupção, que são maiores do que as que existem hoje no Regime Jurídico Único. Então, assim como há o reconhecimento do poder decisório do auditor-fiscal, da sua autonomia para o desempenho da função, há também o contrapeso, que são regras que previnem quanto a desvios funcionais.

FOLHA DIRIGIDA - E dentro dessa Lei Orgânica, quais são os principais pontos no sentido da valorização da carreira?
- É essa questão do livre convencimento, o reconhecimento expresso de que o auditor-fiscal é a autoridade administrativa dentro da Receita Federal, que é responsável pelo lançamento do crédito tributário; a questão do livre acesso a estabelecimentos comerciais e industriais, porque sem ter o livre acesso, perde-se o flagrante. O auditor não pode ficar sujeito a ser barrado na porta ou a ter que avisar com dias de antecedência qual a hora que ele vai chegar, porque aí o flagrante vai embora. Têm vários pontos da Lei Orgânica que tratam da valorização. Mas não é só a valorização do auditor. Mais do que isso, é preciso entender a Lei Orgânica como um instrumento de trabalho, que vai dar ao auditor não poder, mas as condições de exercer a sua função em nome da sociedade.

FOLHA DIRIGIDA - Mas há alguma tipo de valorização do ponto de vista financeiro, com benefícios, entre outros?
- Não. A Lei Orgânica não é para tratar de salário. O salário é em decorrência do nosso trabalho. Do bom trabalho que fazemos. A Lei Orgânica trata da melhoria das condições para podermos trabalhar. E não da melhoria das nossas condições financeiras. Isso é uma decorrência.

FOLHA DIRIGIDA - Voltando a expectativa de retomada dos concursos periódicos por parte da Receita, o Sindifisco Nacional tem feito cobranças nesse sentido?
- É evidente que as nossas fronteiras não estão suficientemente guarnecidas. Precisamos de auditores-fiscais para ocupar esses postos. Então, defendemos sim que haja concursos freqüentes para auditor, até para que o pessoal que entrou no concurso anterior não fique quatro, cinco anos (longe dos grandes centros), como ficaram esses do penúltimo concurso (de 2005). É preciso que haja uma troca, uma oxigenação. Acho que os concursos deveriam ser anuais, ou pelo menos a cada dois anos, para, no mínimo, suprir a falta daqueles que estão se aposentando. Nós somos 12.500 auditores hoje na ativa. É difícil dizer se isso é muito ou é pouco. Mas, com certeza, é preciso haver uma oxigenação. Muitos se aposentam anualmente e, no mínimo, esse quantitativo tem que ser reposto.

FOLHA DIRIGIDA - E em quais áreas há uma carência explícita de auditores?
- Nós temos carência de auditores em várias áreas. Mas para efeito de concurso especificamente, as regiões onde há maior carência são as Sul e Norte. As fronteiras com a Argentina, Paraguai, Colômbia, Venezuela, os portos e aeroportos de uma forma geral. E tem uma coisa importante. Estamos lutando por um adicional de localidade inóspita. Então, para as pessoas que vão para esses lugares, até como incentivo para irem, como uma espécie de indenização por estarem ocupando esse cargo em locais tão inóspitos, nós temos esse projeto, que está previsto na Lei Orgânica, para elas receberem 10, 15 ou 20% sobre o subsídio, dependendo do grau de dificuldade de morar naquela cidade.

FOLHA DIRIGIDA - E é uma forma também de não haver uma evasão tão grande quando for aberta a possibilidade de remoção?
- Exatamente. É para podermos ocupar as fronteiras. Isso está sendo encaminhado na Lei Orgânica e também está sendo estudado em outras legislações que estão sendo negociadas com o Poder Executivo.

FOLHA DIRIGIDA - A expectativa é de que a Lei Orgânica do Fisco possa ser aprovada até quando?
- Ela está no Ministério da Fazenda. Está aguardando a aprovação e nós acreditamos que depois das eleições, ela saia do ministério. E ainda vai percorrer um caminho pelo Ministério do Planejamento, Casa Civil, e dali para o Congresso Nacional. A nossa expectativa era até o fim do ano, mas acho que não vai ser mais possível. Acredito que no primeiro semestre do ano que vem poderemos ter uma Lei Orgânica no Congresso Nacional.

Fonte: Folha Dirigida
Créditos pela notícia: user rborges do FC

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